9/27/2016

eu vejo pontos que piscam pelo ar
suspensos em sua estranha existência
dentro e fora da minha realidade
não há verdade, nem há lembrança

eu sinto dores pelo corpo a cada respirar
e quando eu paro e penso e vejo
sinto que não há dor nenhuma no corpo em que me deito
a não ser em minha alma, a mente, que gosto de chamar

mente pra mim mesmo o corpo que habito
planta a semente do que eu acho que acredito
e me fecha entre muros de pele, cabelo, remela e sais

e na fé de ter fé no que eu sinto que acredito
visto o corpo morto que sinto que habito
e aprisiono a mente, a alma, numa existência de não mais

9/02/2016

nossos antepassados tinham um objetivo básico em suas existências: se manterem vivos.
seus dias e noites estavam permeados pelo propósito de encontrar abrigo, fugir dos predadores, encontrar alimentos, driblar doenças e perpetuar a porra da espécie.

o que somos nós agora dentro dessa vida em uma sociedade mais organizada, com leis, deveres, facilidade de comer, de se curar, de se abrigar, de procriar? crianças mimadas que reclamam da porra toda?

não, nós somos o resultado fodido de um processo de seleção natural que nos fez chegar até aqui e agora, na virada da maré, não sabemos como agir.

foda-se

a mudança de paradigma vai levar anos para acontecer. muitos. mas nós estamos sentindo ela na pele porque a revolução tecnológica e científica foram absurdas nesses anos em que vivemos.

e nossas vidas hoje são permeadas pela busca incessante por uma sobrevivência que já temos. trabalhamos 12h por dia, 16, 18... ou mergulhamos na inércia de merda de trabalhar o caralho de 8h por dia, ver novela, e deitar cedo.

tudo é uma merda e a culpa não é minha. é nossa.

7/09/2016

há anos eu escrevo nesse blog.
ha mais de uma década eu iniciei os posts. o próprio blog migrou de um lugar para o outro, não me lembro bem, e eu perdi alguns posts.

olhando esse blog novamente, percebo quem eu fui e sou.

eu não consigo imaginar uma vida sem ser depressivo.

isso sou eu.

viver uma vida assim é quase tão limitante quando ter uma deficiência física. é uma faca cravada na sua alegria que te impede de ser feliz. a felicidade só dura alguns segs.

já se foram 35 anos assim. não sei o que vem por aí.

não quero pensar.

não quero pena

não quero mais ajuda

quando eu fico bêbado, me sinto melhor

em geral, me sinto péssimo

não há como entender, sou apenas eu

sinto que está pior dessa vez. mas pode ser só impressão.

eu queria poder viver.

6/08/2016

é interessante perceber que não me sinto de lugar algum agora. estou deslocado do tempo, deslocado da existência. não me sinto de família alguma, só alguém só, que recebe como caridade algo de quem está perto.
é interessante perceber que não me sinto mal com isso. é uma constatação, não uma depressão.
hoje eu acho que comecei a morrer. eu percebi que não posso ser eu, então, decidi morrer.
não pertencendo a lugar algum, morrer não me muda nada. apenas me liga a algum chão onde minhas memórias podem se desintegrar.
amanhã acordo morto. quem vai abrir os olhos e tomar o café não serei eu. uma sombra de mim, melhor que eu, mas apodrecendo por dentro a cada dia.
cansar de viver é cansar de tentar. e perceber que tudo ao meu redor não me pertence me mostrou que eu já estava passando da hora.
nada reconheço como parte de mim.
que esse eu, que eu achava ser real, deixe logo de existir.

5/17/2016

eu sou um completo talvez
um incompleto
um ninguém

nao pretendo ser
um completo alguém
sou só eu
incompleto, talvez

se bem que nunca ninguém foi
completo, incompleto, talvez
sou, sei que sou

um ninguém que já é
que já foi, que nunca será
tentando esquecer
o que um dia vai ser

4/29/2016

Senta sob a janela e deseja a rua
Olha a parede e encara a jaula
Correr lá fora parece longe
Correr lá fora é melhor que esperar

Ela tem nojo de seu reflexo
Olha pras mãos e se reconhece
Humana suja, virótica, podre
Humana humana, auto-humana

Morrer é melhor
Do que ser humano.

4/11/2016

não fez planos
acordava e dormia cada dia
como cada dia

pecou em tudo
sem planos, tudo era nada
em toda a vida

1/23/2016

Quando eu estava morrendo, tudo se coloriu da minha cor predileta. Como se eu estivesse acabado de colocar óculos especiais, que tornassem tudo perfeito visualmente. Cada sombra, cada linha de cada rosto tornou-se uma textura de pura beleza, dentro da minha cor predileta.

Eu estava deitado, olhava inclinado para as pessoas. Um cheiro de árvores invadiu a sala e, junto com o que eu estava vendo, construiu algo que em nenhum momento eu conseguira. E, junto com o cheiro, o som de ondas à distância de um mar poético em cada um de seus movimentos. O mar se aproximou de mim e agora tudo estava colorido, perfumado e musical.

Eu pude ver e ouvir a voz de pessoas que eu sempre amei mais uma vez. Estavam sorrindo, mas o sorriso espelhava a tristeza e eu não conseguiria nunca dizer o quão delicioso estava sendo morrer. Eles não precisavam sentir essa tristeza. Naquele momento eu percebi que a morte é o presente da vida, o ponto final que dá todo o significado a uma extensa poesia.

Iniciamos nosso texto tendo nossas mãos seguradas pelas dos nossos pais. As letras saem tortas, tremidas e há sempre ali o resultado de mais de uma mente escrevendo em uníssono. Com o tempo, aprendemos a escrever cada vez mais sozinhos. Até que um dia não queremos mais a ajuda de ninguém e nossos versos mudam o estilo drasticamente. Os meus se encheram de revolta, de dúvida, de tristeza, de uma solidão que só eu mesmo sentia.

E com o passar dos dias eu encontrei alguém para me ajudar a escrever cada linha do que ainda faltava dessa poesia. Alguns versos agora saiam sem estilo, uns, sem métrica, outros, péssimos. A maioria, no entanto, refletia um detalhamento artístico que eu nunca conseguiria sozinho. Lindas estrofes em perfeita sintonia.

O tempo passou e eu percebi muitas vezes que havia me perdido. Eu nunca conseguia entender o motivo da minha existência. E quando eu me deitei, escrevi os versos mais amargos que já havia escrito.

Mas naquele exato momento em que eu estava morrendo, tudo se explicou. Do entendimento do nascimento aos planetas em todas as constelações. Da existência da vida ao enigma da morte. E eu percebi que eu nunca estive tão feliz na vida. Não havia dor, não havia medo. Só o verde nas pessoas, os aromas e os sons. E tudo ficou longe e eu não mais me importei com nada.

E agora, descrevendo esse momento, olho ao meu redor e percebo que nada realmente importa muito. Preciso viver, mas isso não tem importância. Cada passo dado, cada verso escrito, são apenas substância necessária para construir o caminho para o ponto final.

Levanto-me. Vou à geladeira buscar mais uma cerveja. Eu estou sozinho, gravando vocais para uma música. E isso é apenas substância, algo para se fazer, enquanto espero pelo ponto final.